sábado, 28 de agosto de 2010

 
   Hospital


         E o que temia aconteceu. A doença já não estava mais na alma, mas no corpo. Não era algo mais que só meu afeto podia curar, e isso me desagradava muito. Insisti que consultássemos o especialista. Por mais que fosse contrário, foi. Chegando, corredores e corredores, cercadas de pessoas, paredes, coisas, mas tudo branco. De vez uma pitada rubra para dinamizar as coisas. Enfim, a saleta, apertada. Uma mesa, uma maca, alguns aparelhos básicos e um senhor risonho, barbudo e sorridente nos abraçando e cumprimentando. Depois de uma longa conversa, o pediu para deitar-se na maca. Foi o único instante que soltamos as mãos. Deitou e ali ficou um bom tempo. Aos poucos, o sorriso do senhor tornava-se um rosto fechado e tenso. E o que temia aconteceu. Não saiu mais daquela maca por um bom tempo. Trocou de leito, de setor, mas ali, na maca. Mas não fui covarde. Todo dia. Prontidão servida. Flores do campo no vaso, sorriso no rosto, beijo na boca e a promessa. Sempre. Independente da hora, do dia, do ano. Foi abandono e entrega. Foi amor e loucura. Larguei de tudo, só para ficar com ele, só para ter o toque das suas mãos todo dia, e convencê-lo de quanto eu estava junto dele. E se foram ali quatro anos da vida dos dois, de loucura, de sorrisos, mas sobre tudo de amor. Todos se juraram contra, mas eu permaneci ali junto dele até o fim. E que fim. Saímos do hospital do jeito que entramos, certamente que um pouco mais velhos, e decididos. De mãos dadas juramos. Amor eterno. Amor além da vida. Amor hospitaleiro. De mãos dadas, entregues a vida, e pensando, ainda bem que aconteceu.

Ana Siqueira – 28 de agosto de 2010

*esse texto saiu estranho, foi meio contra mim. rs

domingo, 22 de agosto de 2010

Foi...
Apaixonado, intenso, quente e envolvente. 
Como o tango.
Os corpos se encaixaram. 
A sintonia foi perfeita.
Foi o ofegar mais desejado, a dor mais prazerosa. 
Foi a noite, em que o tango se fez carne, e o sexo se fez música. 
Luxúria e sintonia.
Foi...
O vinho mais antigo, da uva mais doce. 
a boca mais molhada, e os lábios mais ainda.
Perfeito e caloroso.
Saudoso e infinito.
Pra sempre, e acabado ali.
O abraço mais caloroso. O sim mais bem dado. 
A quentura derramada sem arrependimento.
A língua mais bem posta. O membro sem direção. 
A dança mais esperada. O tango.
Quente, apaixonado, intenso... 



                 "Por una cabeza,
                       todas las locuras.
                               Su boca que besa"
                                                   Carlos Gardel.



http://www.youtube.com/watch?v=dBHhSVJ_S6A&feature=related


Ana Siqueira - 22 de agosto de 2010

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Só mais uma.



       Já era o entardecer, era sinal de que estávamos ali há muito tempo, sentados sem ação. Ambos no chão de frente para o espelho que o sol fizera. Eu, de pernas cruzadas, do meu lado, ele esticado sem pretensões. Fomos largados pelos outros dois, que ficaram a alguns metros. Nos olhamos e desviamos os olhares muitas vezes. Diria infinitas vezes. Mãos nas mãos. Eu queria mesmo é dizer o quanto amava, sem sucesso. O quanto aquilo estava preso dentro de mim, desde que me fiz mulher. Desde quanto o desejei como presa e não mais amigo ou até mesmo irmão. Para ele, só mais uma. Desabrochei. Dos olhos meus não se viam mais luz. Via-se água. Jorrou, jorrou, jorrou. Por fim suspirou. Sua mão acalmou meu peito tremulo. Seu calor confortou o frio que meu coração sentia e o medo que se aproximava. Chegará a hora. Só mais uma para ele. Jorrou mais forte e mais intenso. Sussurrava palavras intensas, e de suplicio, mas, sobretudo de amor. Mas que adiantará? Só mais uma. Olho no olho. Com uma das mãos, envolveu uma lágrima teimosa que quis se mostrar no meu rosto, e ela dali não passou. Sua outra mão aos poucos envolveu minha cintura. Frente a frente. Olhou-me e voltou seu olhar para minha boca. O batimento e o sangue subiram. Olhei teus lábios também. Rendi-me ao sentimento involuntário das mãos que as levaram ao seu corpo. O primeiro e único gesto, depois dele, só mais uma. O beijo. Quente, de quem ama e quem não é amado. Foi o êxtase, o melhor, o mais longo, o mais delongo e enrolado. Toda via o mais esperado. Não queria o fim. Sabia que seria o fim. Temia e chegou. Abrimos os olhos. Ele sorriu, eu sangrei. Sabia que era só mais um beijo, o primeiro, o ultimo e sim, o mais. Ele se foi. Nunca mais o ‘oi’, o ‘querida’, muito menos o ‘está bem?’. De longe passara, quem sabe olhava. Mas entre olhos fugia. Lembrava-se do meu eu, da antes menina. Agora, lembrança, ou talvez nem isso, de apenas mais uma. Só mais uma.

Ana Siqueira - 18 de agosto de 2010

sábado, 14 de agosto de 2010

O rádio. A flor. Sem dor.

Amigos Gustavo Paiva e Anne Karoline
Fitas por: Anne Karoline, Gustavo Paiva e Ana Siqueira. 2009.
Música A Flor - Los Hermanos - Composição: Rodrigo Amarante/Marcelo Camelo

O rádio. A flor. Sem dor.

Eu a amava. Como ninguém jurava que poderia, nem mesmo eu. E ela me amará da mesma forma, achava. Era flô em dia de sol na primavera, era sereno na minha janela. Era amor.

Ouvi dizer, do o teu olhar ao ver a flor..." Inflamou-se.

Eu a sentia, e assim fiz. Tudo junto, tudo com ela, tudo pra ela. Ela. Era festa. Amigos, fuzuês e vodka. Riamos como calor de verão. Como hilariantes comédias de teatro de campanha. Como pão e circo. Sem perceber.

Não sei por que, achou ser de um outro rapaz. Foi capaz de se entregar” Fez sentido.

Os olhos não foram para mim. Menos o sorriso. Amor! Ah, dor! Amor doente. Finge não ver a névoa, fingi estar em paz, sorri e bebi.

“Eu fiz de tudo pra ganhar você pra mim, mas mesmo assim...” Foi suplício.

Sorri, elogiei, cantei, dancei, chorei. Entreguei tudo. A valsa não tinha o mesmo compasso. Os olhares tão menos o fogo. A boca já não tinha o mesmo tom. E o pulsar, esse já não pulsava por mim.

“Minha flor serviu pra que você, achasse alguém, um outro alguém que me tomou o seu amor. E eu fiz de tudo pra você perceber, que era eu...” Sangrei.

Retirou-se. Da vida, da canção, da festa, do meu amor. Do louco tolo que simples assim entregou-se. E agora? Que faço sem minha essência. Desonroso, fui, de não tentar. Despacho. Desfeito. Desabado.

“Tua flor me deu alguém pra amar. E quanto a mim?” Morri.

Sem mais ninguém. Sem mais alguém. Sem um talvez. Acompanhado de um nunca mais.

“Você assim e eu, por final sem meu lugar. E eu tive tudo sem saber quem era eu...” Tentei.

Tentei alguém. Um novo aroma. Uma nova fruta. Sem temer. Enfim.

“Eu que nunca amei a ninguém” Desisti.

Acabou-se a música. Chegou ao fim o amor, que fez de tudo pra não rimar com ‘im’. Restaram flores, coroa, velas e dores. A saudade, e que saudade.

“Pude, então, enfim, amar...vai...”

Não com ela, mas sempre dela.

Ana Siqueira - 14 de agosto de 2010

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

E de um vento da zona norte;

Só;


Voltando do serviço, eu observava as pessoas ao meu redor, coisa não muito comum. Percebi o quão orgulhosa sou. Porque não olhei pro lado? Ninguém reparou que estava ali. Nenhum olhar penetrou. Conseqüentemente, casais. Apaixonados, brigados, enamorados, enfim casais. Olhei para minha mão direita, só via uma pasta preta, forrada de folhas, olhei para a esquerda, meu celular. Deus. A idade já não era a mesma e me percebi ali, no meio do centro, sozinha. Sentei-me. Naquele banco fiquei horas, dias, anos. Pensando ou morrendo? Sou sozinha. Porque não olhei pro jornaleiro da esquina? Ou pro conhecido da minha tia? Deus! O amor da minha vida, a minha paixão de adolescente. Será que era ele? O garoto que eu não dei a chance. As flores que eu recusei, o tapa que eu dei. A traição que não perdoei. Não creio. E o convite pra jantar? A música que eu não quis ouvir. E o sim que rejeitei. Só, e somente só. Posso achar ele em outra esquina. Ou ela em uma boate. Mas será que ele iria conseguir ser o senhor do meu tempo, como aquele rapaz da caixa de bombom? Passou, só, e somente só. Vou reparar. Achar o telefone. Olhar “pro homi”. Pedir o perdão. Molhar o calção. Achar o ladrão. Enfim, viver com meu coração. Encher o sim, dispensar o não.

Ana Siqueira - 13 de agosto de 2010 - Sexta-feira.

sábado, 7 de agosto de 2010

Dorme comigo?


Estávamos eu e meu namorado voltando de um passeio com os amigos. Falamos sobre a vida alheia dos outros e os furos da semana. Bebemos, comemos e... Bebemos novamente. Estávamos rindo ali. Esquecendo-nos da vida.
Era tarde, cada qual em seu respectivo veiculo, como não bebia, dirigi e alguns foram com a gente. Após o tour pela cidade, chegamos na frente do apartamento dele. O beijo era pra ser de despedida, mas virou beijo longo, beijo de amor, beijo quente, beijo e virou fogo. Não pude evitar, subimos.
No quarto, todo de fogo tirou a blusa, e ali seria a primeira vez; mas disse:
- Dorme comigo esta noite?
- Como assim, dorme?
- É, deita do meu lado, ouve meu coração. Pra que minha carne, seja audacioso, queira minha alma. Sorri.
- Só minha namorada pra querer uma coisa dessas. Decepcionado.
- Dorme comigo? Vou te esperar - Deitei do lado direito, olhando para ele, que estava de costas sentado na parte oposta da cama.
Alguns minutos depois ele se rende, se deita, nos cobre com o edredom quente e só me questiona porque daquela situação. Eu só conseguia dizer que estar ali olhando pra ele, sentindo ele, quente como ele, era a minha sensação de êxtase. Era meu ápice. O que eu queria para provar, que eu não quero seu corpo porque o corpo se vai, que eu não quero nada mais além dele, do meu lado, pra sempre. E assim, sorrindo, nos entregamos a uma noite que não foi de prazer, mas foi. Um prazer que nem o sexo propriamente dito nos proporcionaria. Acordei abraçada com o amor, que me segurava do vento. Hoje ele tinha não mais meu coração, mas minha alma nas mãos.