sexta-feira, 30 de outubro de 2015

Putas também amam: 
Parte I : Carmem

Carmem começou se prostituir com 19 anos. Ela não tinha uma vida difícil, não era dependente química e não tinha motivos para se tornar, mas tornou-se. Era conhecida pelo serviço "limpo" e discreto e pelo preço justo. Quanto cobra-se? Carmem queria ser enfermeira, mas tinha medo de sangue, não queria se casar, mas amou João. Amou tanto que até hoje, só suporta a profissão, por lembrar de João, e talvez, por imaginar ele no lugar daqueles homens que a consomem. 
João era um rapaz do bairro, um garoto ideal. Ele não tinha uma vida difícil, mas tornou-se dependente químico. Carmem, que ainda se chamava Clara era sua amiga de infância, de brincadeiras de pique-esconde, de empoleirar-se nas árvores para roubar manga verde. Clara e João eram inseparáveis. 
Lá pelos 17 anos dos dois, se beijaram pela primeira vez e se amaram, mas, ainda tinha outra paixão, que não conseguia largar. Certa vez, em um dia de noite escura, voltando para casa, surpreendeu-se com seu "chefe", apontando-lhe uma arma e querendo seus resultados. João os havia consumido, e a bala, consumido seu peito. 
Clara que já não tinha peito, não tinha lágrima e não tinha fé, tornou-se Carmem, tornou-se sangue frio, tornou-se o que é. Clara nunca mais amou ninguém, ou para ser sincero com o leitor, amou Carmem, sua confidente e sua válvula de escape. Carmem, seu cigarro e suas pernas se tornaram seu produto. Carmem ainda tinha tempo para ler livros de romance, e recordar-se de João e Clara. Carmem ainda tinha tempo de vez ou outra, visitar a morada de João, levar flores e fazer orações, pedia perdão e dizia baixinho: eu ainda te espero, mal vista, vestida, caída, mas cheia de amor. 

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