quinta-feira, 6 de junho de 2013

Xícara dobrada.


          Este rosto que me espera para um papo não parece padecer por desgosto nessa mesa junto a sua xícara de café amargo. Em um passe de mágica me vejo acompanhando ele na mesma amargura, requentada, mas fria. Seu olhar me persegue desde meu chapéu até a ponta de meu sapato camurça surrado pelo asfalto. Deixo claro aqui que as rugas que eu via naquele rosto ranzinza me lembravam a de meu pai e os lábios eram os de minha tia Glória, sim, minha tia, o rosto dele ou o meu não lembravam as feições de minha mãe, talvez o peso lembrasse. Quando me curvei para reparar nos seus flácidos glúteos que travavam uma briga para permanecer em cima da banqueta, ele se curvou junto franzindo a testa, o nariz e os lábios, não me questionando como, parecia se irritar com meu gesto e assim ficou.
         Da mesa lhe subiu a xícara de café junto comigo até a boca, o aroma nos enfeitiçava, por mais que fosse velho, era café de história servido às 16h de um dia comum, com sol, com crianças nas ruas e velhos nas praças, pessoas nascendo e morrendo, e aquele senhor diante de mim, parecia fritar-me. Pensei que ele podia não ter se importado com minha pessoa ter se juntado a ele para a pequena pausa, mas me embaralho e derramo café sobre a calça de alfaiataria que tinha desde os tempos áureos, quando volto meus olhos para o velho, me vejo no espelho, maltrapilho. Não aceitei minhas rugas me reinventei em alguém que não existia e só assim percebi que não havia xícara, café ou outro senhor. Apenas eu e meus calos.

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